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O que aprendi meditando todos os dias por um ano

E como isso pode ser útil pra tudo na sua vida

As pessoas têm me perguntado um bocado nos últimos dias sobre o meu processo de escrita, especialmente agora que eu finalmente pareço ter encontrado um jeito de manter a consistência nas publicações.

Tem mil coisas que dá pra dizer sobre isso, principalmente porque eu não me basto quando começo a falar sobre processos e truques mentais pra criatividade.

Mas, ao invés de partir pra alguma coisa relacionada à escrita em si, acho que é importante falar sobre como consegui criar as causas pra disciplina que atualmente vêm transbordando pra tudo o que faço.

Resumidamente, eu fiz um experimento de praticar meditação todos os dias por um ano que foi muito transformador.

Então, aqui embaixo eu conto um pouco do que aprendi na esperança de que seja útil também pra sua jornada.

Faça compromissos pequenos

Ano passado, eu comecei a sentir uma atração pelo darma, como nunca antes. Eu voltei a me conectar com a prática espiritual por meio dos ensinamentos de mestres como Chagdud Rinpoche, Lama Padma Samten e Tenzin Wangyal Rinpoche. Iniciei minhas práticas aqui e ali, sem muita consistência e, principalmente, sem um plano.

Em um certo ponto, percebi que seria importante criar compromissos, como uma forma de dar coesão à prática.

Mas, ansioso que sou, sei que tenho alguns obstáculos nos quais sempre caio: um é o de determinar compromissos muito difíceis. Outro é de me sentir paralisado diante dos compromissos que eu mesmo determino.

Fiz isso inúmeras vezes na vida de formas diferentes.

Mas dessa vez, eu primeiro determinei que apenas sentaria por pelo menos um minuto todos os dias durante uma semana. Quando consegui, pensei… é, agora vou até duas semanas. Depois um mês. Depois três meses. Depois seis meses. E, finalmente, um ano.

Cada vez que eu atingia um certo checkpoint, sentia que dava pra ir mais um pouquinho e fui aumentando gradativamente, até o ponto que me senti pronto pra tentar algo mais ambicioso.

Isso é importante por diversos motivos, mas o principal que eu citaria é: tendo esses pequenos demarcadores de sucesso podemos nos sentir recompensados. Vamos articulando e entendendo, pouco a pouco o nosso processo, como funcionamos, como nos preenchemos. Podemos usar essa mesma sensação como um impulso. “Poxa, que legal que eu consegui isso… será que consigo mais?”

Faça mal-feito, mas faça

Eu achava que ao iniciar minha prática, subitamente sentiria uma energia que me arrebataria todos os dias e nada ia me parar. Mas a verdade é que em questão de dias, eu já estava entediado e não só não tinha vontade de meditar, como tinha uma vontade ativa de fugir da prática.

Em diversos momentos, eu me sabotava e fazia coisas que me afastavam da meditação, seja comer demais, deixar para o último minuto do dia quando já estava exausto ou beber demais no dia anterior ao ponto de ficar com a mente em frangalhos no outro dia.

Por outro lado, alguma coisa em mim entendia que o compromisso era importante e, então, eu sentava e praticava.

O que é legal pontuar é que isso não quer dizer que eu de repente virava o pequeno Buda e minha mente era transportada para as terras puras pelo milagre da meditação. Na verdade, eu sentava e dormia, não conseguia me concentrar, ficava me mexendo, sofria com a ansiedade e, muitas vezes, fazia o menor esforço possível. Não era raro, especialmente nesse começo, que eu sentasse por apenas um ou cinco minutos. O mínimo do mínimo e ainda mal-feito. Muito mal-feito.

Mas, com o tempo, fui me sentindo mais à vontade. Percebi que os cinco minutos eram insuficientes e fui aumentando meu período de prática, estudando mais, incorporando outros elementos. Assim, quando menos percebi, esse se tornou o melhor momento do meu dia, meu refúgio.

Crie formas de visualizar seu progresso

Desde o começo, acompanhei meu progresso por um aplicativo chamado Loop. É um aplicativo de controle de hábitos que tem no Android. Não tem pra iPhone, mas não é difícil encontrar similares.

O ponto é que esse aplicativo tem uma série de gráficos e métricas pra mostrar como você está se saindo. No meu caso, algo que foi super importante foi abrir o aplicativo, marcar os dias nos quais fiz a prática e ver os números subindo. Quando eu já estava com alguns dias praticando, me sentia motivado apenas por pensar que eu não podia quebrar a corrente. Os gráficos iam ficando verdinhos, as barras subindo e eu seguia como se estivesse jogando um videogame.

É uma motivação das mais porcas, eu sei, mas o que importa é que me ajudou.

Não é porque você falhou hoje que deve falhar pra sempre

Contar a história e dizer que eu consegui manter a minha prática imaculada por um ano inteiro sem falhar seria lindo. Eu queria, de verdade, poder dizer isso. Mas a verdade é que eu falhei em dois momentos. Eu simplesmente esqueci da prática. Dormi e acordei no outro dia “putz, não acredito”.

Eu me remoí muito, porque já estava com mais de seis meses de prática acumulada. Sou do tipo que desanima demais com adversidades e essa falha me pegou forte.

Mas por algum milagre, decidi seguir assim mesmo. Marquei aquele dia no meu calendário e continuei porque depois de alguns dias percebi que aquilo não significava muito. O que era um dia em um ano? Depois, acabei repetindo o mesmo erro mais uma vez, mas eu tinha pacificado comigo mesmo pensando que se fosse o caso, poderia somar mais dois dias ao final da prática pra compensar.

A questão é que não importa se você falhou ou não, o importante é seguir. Não é porque você falhou hoje que deve falhar amanhã de novo ou pra todo o sempre. Se você continua, a prática segue se acumulando e os benefícios vão transbordando. Você aprende cada vez mais, amplia seu entendimento e vai assimilando aspectos cada vez mais sutis daquela coisa.

Lembre do conceito de acumulação

Ainda que eu sinta uma certa vergonha desses dois dias de falha, a verdade é que eles são um detalhe pequeno. Não importa que eu tive essas duas falhas tanto quanto importa o que eu tirei de ter continuado.

Tudo que a gente faz repetidamente se acumula. Se você sente raiva de algo todos os dias da sua vida, com o tempo essa raiva se transforma em ódio e, quando você menos espera, está andando armado pra caçar seja lá o que for que te irrita ou causa medo.

Por outro lado, se o que você cultiva é criatividade, amor, generosidade ou disciplina, essas características também crescem e se acumulam. Você vai descobrindo cada vez mais formas de ser criativo, amoroso, generoso ou disciplinado.

Isso vale pra tudo, de verdade. Então, se você quer escrever ou aprender a tocar um instrumento, não tem muito jeito. Você pode se encher de textos e vídeos falando sobre como ser mais criativo e disciplinado, mas a verdade é que vai precisar pegar o papel, a caneta ou o violão e fazer o que se propôs.

Não dá pra entender muita coisa antes do fazer e, pra ser sincero, a maioria das coisas que eu achava que entendia antes mais me atrapalhavam do que ajudavam.

O resumo é: não se preocupe se você não sabe como fazer, se vai sair tudo feio, torto, mal talhado. Confie no processo e na acumulação. Eventualmente, pela repetição e estudo, as coisas se encaixam.

O processo nunca termina

Nossa cultura tem uma obsessão por encaixotar e produtizar as coisas, sempre reforçando uma ideia de que soluções mágicas existem. Quer ser mais criativo? Vou te dar um workshop de um final de semana e a sua vida nunca mais vai ser a mesma. Quer ter um relacionamento mais saudável? Vem pra minha palestra, eu vou te dizer uma coisa que vai mudar a sua vida. Quer melhorar sua vida financeira? Baixe minha planilha e nunca mais se endivide de novo.

Isso não existe.

Tudo é processo e prática. E, mais ainda: o processo nunca termina.

Dá pra aprender infinitamente sobre o que quer que seja importante pra você. Aceitar isso é o que foi funcionando pra mim: não existe linha de chegada.

Não vamos nos tornar mestres supremos e nem resolver todos os problemas. É essencial incorporar a noção de que ser quem queremos ser é um processo diário, que vamos falhar, vamos nos perceber fraudes e vamos ter que recolher nossos cacos e recomeçar infinitas vezes.

Sem essa noção, é impossível suportarmos as inúmeras adversidades que sempre aparecem. Sem aceitar que não existe mágica e que o caminho é maior que o momento, todas as vezes que o nosso castelinho for ao chão, nós vamos parar, desistir e retornar ao mesmo estado, nos distanciando cada vez mais de uma vida plena até o momento que o tempo acaba e morremos.

Concluindo

Esses foram alguns insights que extraí da prática de meditação e que me servem também na hora de escrever textos e músicas. Meu álbum foi feito assim e, agora, essa newsletter também está se mantendo baseada nos mesmos princípios.

Como falei aqui em cima, é um processo. Todos os dias aprendo algo a respeito de como lidar com meus obstáculos e, principalmente, como posso acolhê-los e transformá-los.

Mas agora me conta, esse texto ressoa em você? Tem alguma coisa que gostaria de adicionar? Comenta aí e vamos conversar. 🙂

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